Friction zone
Série 'Taking measures'
(2025)
Processo criativo | Walking art | Fotografia | Vídeo | Desenho | Som
Projeto apoiado pelo Walking Art Lab e realizado na fronteira entre Azerbaijão e Geórgia.
WAL é uma plataforma de pesquisa experimental dedicada a práticas de caminhada por meio do pensamento espacial crítico e do questionamento dos limites entre teoria e prática.
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Friction zone | 2025
Documentação de campo | fotografia
Na névoa úmida de Lagodekhi, sob o dossel da floresta mais antiga da Geórgia, um rio desenha a fronteira como um stylus sobre a pele da terra. O Matsimis Tskali - curso d’água que é ferida e sutura - traça seu caminho entre raízes e geopolíticas, enquanto a trilha, obediente, repete seu contorno. Aqui, a natureza não é paisagem, mas arquivo vivo: cada pedra, um registro; cada sombra, um código decifrado apenas pelos soldados que vigiam o limite.
Para caminhar é preciso negociar com o Estado. No meio do percurso, um posto militar emerge como um ready-made absurdo: passaportes são exibidos, nomes anotados em cadernos de capa verde, e o corpo do viajante transforma-se em dado biométrico. As câmeras, penduradas em troncos como frutas metálicas, capturam movimentos e os convertem em algoritmos de suspeita. A floresta, então, não é mais sublime - é um sistema de vigilância onde galhos se dobram em ângulos de monitoramento.
Câmera de monitoramento na trilha da floresta entre Geórgia e Azerbaijão | Lagodheki, 2025.
Desenho representando a fronteira natural - o curso do rio Matsima Tskali.
Gravadores colhem o sussurro da água misturado ao estalido das antenas de satélite; desenhos em cadernos moles registram a tensão entre a folhagem e as cercas de arame; fotografias congelam o instante em que um pássaro cruza a fronteira sem mostrar documentos. O GPS, por sua vez, desenha linhas quebradas no ar — geografias especulativas onde o rio é simultaneamente mapa e armadilha.
O que emerge dessa documentação obstinada?
Uma coreografia do controle, é claro, mas também um palimpsesto de ausências: o rastro do urso que evita as câmeras, o eco das conversas em azeri apagadas pelo vento, o silêncio dos passaportes carimbados que nunca retornarão. A trilha, afinal, não é um caminho: é uma pergunta aberta sobre até onde a arte pode infiltrar-se nas frestas do poder sem ser engolida pela mesma burocracia que regula as árvores.
Taking Measures é um projeto em andamento nas Grandes Montanhas do Cáucaso que lida com práticas de caminhada e medição, bem como o potencial político de poder e resistência resultante dessas práticas.
Registro de campo ao longo da trilha | Fronteira Azerbaijão-Geórgia, 2025.
Documentação de campo | fotografia | Trilha da Fortaleza Machi , 2025
Autorização concedida no posto de controle militar | Lagodheki, 2025
Placa de alerta para não cruzar a área da fronteira | Fronteira Azerbaijão-Geórgia, 2025
Documentação de campo | fotografia Lagodheki, 2025